Quando caminho sob esse sol que explode impiedoso na minha cabeça, sinto ódio de Lúcio, sinto raiva dos meus pés desobedientes e descalços, o asfalto queima minha alma. Procuro um bar, um café, um boteco, qualquer coisa que me tire do meio de todo esse lixo. Trilhos e galopes perpassam meu corpo. Cães mortos e fétidos fecham a avenida. Judas não se enforcaria em troca de míseras moedas. Traidores se escondem nos meus bolsos sujos. Os homens já não disfarçam seus pensamentos nos chapéus. Tanto sofrimento, tanta procura para acabar jogada na vala comum, onde não germinam flores nem palavras. Não consigo esquecer o cheiro forte de nicotina escorrendo fria dos seus dedos. As unhas duras e supostamente amarelas. A barba crescida lembra um comunista que não reparte nem o amargo do próprio cuspe. Não gosto de imaginar aquelas putas roçando o seu rosto sujo. Meu sangue ferve só de supor: “Você enxerga demais, mesmo sem ver nada!”. Imbecil, cretino! Como posso querer vê-lo com outras? Não sou masoquista, no entanto, as imagens me perseguem. Nosso amor sobrevive na carnificina da guerra, em meio a tiros e amputações.
- Me dá um café.
- Com açúcar ou adoçante?
- Não importa. Me traz a droga do café!
- Puro ou com creme? Prefere copo de viagem?
- Você é imbecil ou o quê? Se eu pedi um café é porque quero um café e só.
- Perdão, não quis incomodá-la.
- Vocês são todas iguais, a gente tira o pingo e não são capazes de reconhecer o i.
- Mais alguma coisa?
- Não.
- Pronto, o seu café puro.
- Obrigada.
Rugas envelhecem o asfalto. Eu poderia reclamar por mais alguns minutos, dizer que o café tá frio ou fraco. Cansei, xingá-la não me satisfaz. Nada poderá feri-la. Ela fala baixo e calmo, como as pessoas felizes ou conformadas. Ela é segura, não treme, caso contrário, eu escutaria o barulho da colher na bandeja.
O café ainda está quente. Pequenos vulcões irrompem dentro da xícara, a lava escorre negra e tímida. Poderia sorvê-la, mas eu não gosto de café. Tiros abrem fendas em minhas mãos. A moça do café passa por mim, poderia lhe dar uma rasteira e fazê-la esborrachar no chão, como tantas vezes tenho esborrachado, mesmo na simples descida do meio-fio.
Metade do café fica na xícara. Meu único prazer foi insultar a balconista. No final da tarde, ela nem recordará. Haverá outros clientes, outros xingos. Sentarão nas mesas outros infelizes. Um rio brota incoerente nas veias de um cardíaco.
- Me dá um café.
- Com açúcar ou adoçante?
- Não importa. Me traz a droga do café!
- Puro ou com creme? Prefere copo de viagem?
- Você é imbecil ou o quê? Se eu pedi um café é porque quero um café e só.
- Perdão, não quis incomodá-la.
- Vocês são todas iguais, a gente tira o pingo e não são capazes de reconhecer o i.
- Mais alguma coisa?
- Não.
- Pronto, o seu café puro.
- Obrigada.
Rugas envelhecem o asfalto. Eu poderia reclamar por mais alguns minutos, dizer que o café tá frio ou fraco. Cansei, xingá-la não me satisfaz. Nada poderá feri-la. Ela fala baixo e calmo, como as pessoas felizes ou conformadas. Ela é segura, não treme, caso contrário, eu escutaria o barulho da colher na bandeja.
O café ainda está quente. Pequenos vulcões irrompem dentro da xícara, a lava escorre negra e tímida. Poderia sorvê-la, mas eu não gosto de café. Tiros abrem fendas em minhas mãos. A moça do café passa por mim, poderia lhe dar uma rasteira e fazê-la esborrachar no chão, como tantas vezes tenho esborrachado, mesmo na simples descida do meio-fio.
Metade do café fica na xícara. Meu único prazer foi insultar a balconista. No final da tarde, ela nem recordará. Haverá outros clientes, outros xingos. Sentarão nas mesas outros infelizes. Um rio brota incoerente nas veias de um cardíaco.