Caminho, caminhos entre flores, asfalto e pedras. Todos os lugares me parecem iguais. Caleidoscópios e escafandros. Sirenes, buzinas, gritos, gemidos, buracos, pequenos abismos escondidos no meio-fio. Grandes agonias nas bocas dos velhos, pretensões idiotas nos pés dos jovens. Pássaros tolos e sem asas. Os loucos vomitam margaridas. Nada diverso, nem fora, nem dentro de mim. Orgasmos nascem e morrem entre meus dedos. Na minha cabeça sempre as mesmas palavras, os mesmos gritos, os mesmos tiros, as mesmas canções, partidas e chegadas, cartas sem remetentes, cheiro de enxofre em xícara de café. Nunca vi o diabo, mas desde aquele maldito dia, os tiros, a minha irmã,o resto dela... posso sentir o seu cheiro, posso sentir seu tridente entre minhas costelas. Queria esquecer, não consigo, dez pancadas partem minha nuca. Entro na banca, peço o jornal, apesar de saber que as notícias de hoje são versões das de ontem. Gosto de fazer objetos com jornais. Objetos cinzas. Afinal, de nada servem os excessos de cores. Todos os retalhos desbotam com o tempo. O corte no meu dedo volta a sangrar, estanco com meia dúzia de palavras.Ultimamente é pra isso que me servem as palavras, pra estancar meu sangue pisado. O antigo rio verde brota do asfalto. Caleidoscópios, escafandros e náufragos submergem.
terça-feira, 14 de outubro de 2008
Mosaico de Rancores: capítulo 12
Caminho, caminhos entre flores, asfalto e pedras. Todos os lugares me parecem iguais. Caleidoscópios e escafandros. Sirenes, buzinas, gritos, gemidos, buracos, pequenos abismos escondidos no meio-fio. Grandes agonias nas bocas dos velhos, pretensões idiotas nos pés dos jovens. Pássaros tolos e sem asas. Os loucos vomitam margaridas. Nada diverso, nem fora, nem dentro de mim. Orgasmos nascem e morrem entre meus dedos. Na minha cabeça sempre as mesmas palavras, os mesmos gritos, os mesmos tiros, as mesmas canções, partidas e chegadas, cartas sem remetentes, cheiro de enxofre em xícara de café. Nunca vi o diabo, mas desde aquele maldito dia, os tiros, a minha irmã,o resto dela... posso sentir o seu cheiro, posso sentir seu tridente entre minhas costelas. Queria esquecer, não consigo, dez pancadas partem minha nuca. Entro na banca, peço o jornal, apesar de saber que as notícias de hoje são versões das de ontem. Gosto de fazer objetos com jornais. Objetos cinzas. Afinal, de nada servem os excessos de cores. Todos os retalhos desbotam com o tempo. O corte no meu dedo volta a sangrar, estanco com meia dúzia de palavras.Ultimamente é pra isso que me servem as palavras, pra estancar meu sangue pisado. O antigo rio verde brota do asfalto. Caleidoscópios, escafandros e náufragos submergem.
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22 comentários:
O BAR DO OSSIAN agradece o apoio. Em breve abriremos as portas.
Abraço lusitano!
Klatuu Niktos, Lord of Erewhon
Magnifico como sempre este texto...
as palavras como as lágrima... para as alegrias e dores...
beijinhos das nuvens
Veja seu e-mail. Ainda não é a hora de publicar no Bar.
Acabei de espiar no caleidoscópio, é exatamente essa a idéia do teu texto de imagens que se agrupam e dissipam.´
Gostei muito de tudo, volte sempre.
A casa é sua, entre sem bater.
beijo
Passando aqui para agradecer a visita e o comentário lá em casa.
bjs,
O contraste do cinzento e o sangue marcam... O sangue pisado e as palavras diabólicas que lembram os tiros e as pancadas...
Fabuloso este conto marcante da vida real....
Blood Kisses
"...de nada servem os excessos de cores"?
Não concordo, Márcia.
Eu jamais faria uma pipa com papel de jornal. As nuvens não merecem tanto desafeto.
Um carinho.
Continuemos...
Querida:
Lágrimas, sofrimentos, palavras mescladas, lindo!
Estou aqui para agradecer a força dada ontem e para lhe oferecer um POST DE PAZ.
Um beijo,
Renata
Muito bacana este espaço. Ótimo trabalho com as palavras.
Parabéns...
Marcia, as suas imagens... eu já lhe disse que tenho a nítida impressão de que quando você escreve, ou Deus está a seu lado, escrevendo também, ou então ele pára, a fim de aguardar a conclusão? Talvez já tenha dito isto a algum pintor, desenhista, escultor, mas você esculpe imagens com as palavras. Os orgasmos nas mãos, as mãos no tridente, o enxofre nas narinas, o sagrado e o profano - maniqueísmo que também me consome e repugna, a um só tempo - lado a lado. Eu acho que você é mais livre do que eu sou - nada de se espantar: as mulheres alçam vôos mais altos.
Que prazer, que orgástico prazer intelectual ler os seus quadros, interpretar as suas esculturas (intel)ectoplásmicas. No meu cérebro, um orgíaco festim.
Maravilha... no words...
Beijos, linda, beijos
Marcia, mais um excelente retalho de reflexão acerca da vida, de vidas...Continuarei a acompanhar com prazer.
Passa no meu Templo , deixei-te um regalito(Prémio Dardos) em reconhecimento do trabalho q desenvolves.
Magnetikiss;)
"Caleidoscópios, escafandros e náufragos submergem" num ótimo texto das profundezas! Gostei mesmo e "O corte no meu dedo volta a sangrar, estanco com meia dúzia de palavras" é um belo verso.
abs
Jardineiros
Numa só palavra,cortante!
..em outra palavra, marcante.
a proposito, teu comentario anterior, nao sei, mas senti uma ponta de revolta e desgosto nele. Enganado provavelmente.
De qualquer forma, grande beijo :*
Márcia,desculpe-me o atraso deste comentário, o tempo tem sido escasso e seus textos tem que ser bebidos e saboreados com calma. Este especialmente, forte, emocionante, uma descarga elétrica no coração, parabéns, beijo.
demais. de prender o fôlego.
goodnight lady.
bj
há um momento vazio que tudo é iqual ou seja tudo não é, e ficamos neste jogo do não ser e uma angustia nos permuta a vida.
Como sempre os seus textos são de uma beleza extrema. As suas palavras contagiam-nos, trnsportam-nos para a mensagem que nos quer transmitir.
Beijinhos. Bom fim de semana
sem pedir autorização postei no bragasepoesia
Bárbaro!
Bravo!!
Li e reli!
Sue
fantástico.
corta... a respiração.
beijo*
As palavras resolvem a equação que a mente não consegue decifrar... no more hablar
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